Salmonella é um gênero de bactérias que acometem animais de produção e seres humanos, podendo ser veiculada através de alimentos contaminados como ovos e carne.
A salmonelose se destaca como uma das zoonoses de maior prevalência atualmente, tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento.
A salmonelose é considerada uma enfermidade altamente problemática para a saúde pública, pois a infecção por esse patógeno apresenta alta morbidade e grande dificuldade de controle. Além disso, as salmonelas apresentam um número elevado de diferentes fontes de infecção, em especial as fontes de proteína consumidas na alimentação humana (HOFER et al., 1994).
Nesse contexto, o aumento na frequência de resistência antimicrobiana aos compostos usualmente utilizados na produção animal – para combater agentes patológicos como este, tem se tornado uma ameaça à produção de alimentos dessa origem – especialmente à cadeia de produção de aves no que se trata de Salmonella spp.
Salmonella spp.
O gênero Salmonella foi descoberto por Daniel Salmon (1950-1914), dando origem ao nome do gênero bacteriano (SAIF et al., 2008). As salmonelas são bactérias pertencentes à família Enterobacteriaceae, caracterizadas como bacilos curtos e gram negativos, aeróbios e anaeróbios facultativos flagelados, podendo ser móveis (FRANCO E LANDGRAF, 1996), que infectam diversas espécies animais – dentre elas as aves e o homem.
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O gênero Salmonella é composto por mais de 2.500 sorotipos distintos (BARROW, 1999). A primeira descrição documentada de salmonelose em aves data de 1885 em pombos de rua. Décadas depois, entre os anos de 1920 e 1930, foram descritos os primeiros surtos de Salmonella em galinhas e perus (SILVA, 1991).
Dentre os sorotipos de Salmonella de importância para a avicultura destacam as salmonelas específicas de aves: Salmonella enterica sorovar Pollorum e Salmonella enterica sorovar Gallinarum – agentes causadores da pulorose e do tifo aviário, respectivamente (SALLES, 2007).
Os sorotipos de salmonelas responsáveis por causar as febres tifóide e paratifóide são Salmonella enterica sorovar Enteritidis; Salmonella enterica sorovar Typhimurium; Salmonella enterica sorovar Infantis e Salmonella enterica sorovar Agona, sendo as responsáveis por infecções alimentares importantes para a saúde pública (GAMA, 2001).
As aves podem ser afetadas por diferentes soritpos de Salmonella, apresentando ou não sintomas clínicos, e servindo como um reservatório de bactérias.
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De maneira geral, sorotipos que infectam aves não infectam humanos. Já os sorovares chamados paratíficos não causam sintomas em aves, mas podem causar sintomas em humanos. Como exemplos podem ser citados os sorovares S. Enteritidis e S. Typhimurium. Os sintomas mais comuns na espécie humana são febre, dores de cabeça, vômitos e diarreia.
Infecção por Salmonella spp. e sinais clínicos
A ação patogênica das salmonelas e o estabelecimento dos sintomas variam de acordo com o sorotipo de Salmonella sp. envolvido na infecção e a competência do sistema imunológico do indivíduo afetado (CAMPOS, 2002). A ingestão de Salmonella resulta na colonização intestinal (predominantemente do ceco) e excreção bacteriana nas fezes (SALLES, 2007).
As aves infectadas por Salmonella sp. podem apresentar sinais como sonolência, fraqueza, redução da ingestão de alimentos, baixo desenvolvimento corporal, aderência de excreta à cloaca e tendência a permanecerem próximas a fontes de calor (SAIF et al., 2008). Da mesma forma, as aves infectadas podem carregar essas bactérias sem demonstrar quaisquer sinais clínicos.
As vias de infecção por salmoneloses para as aves são bastante distintas. De maneira geral, a infecção ocorre pelas vias digestórias a partir da ingestão de alimentos contaminados por bactérias excretadas por outras aves infectadas (STACHISSINI et al., 1993).
Contudo, a infecção ainda pode ocorrer pelas vias respiratórias quando o fluxo de ar do ambiente influencia em uma maior ou uma menor infecção por Salmonella sp. (NAKAMURA et al. 1997).
De maneira geral, o tecido intestinal é o local há maior prevalência de colonização por salmoneloses. Contudo, o trato reprodutivo das aves também pode ser colonizado por essas bactérias – como os ovários das fêmeas – trasmitindo salmoneloses para os ovos (METHNER et al., 1995). Esse tipo de transmissão é do tipo vertical. Ainda, bactérias presentes nas fezes – especialmente na cloaca das fêmeas – podem adentrar os ovos antes da formação da cutícula, caracterizando uma transmissão horizontal para os mesmos (SALLES, 2007).
Purolose e tifo aviários
A purolose e o tifo aviário são causados pelos sorotipos de salmonelas imóveis Salmonella enterica sorovar Gallinarum e Salmonella enterica sorovar Pullorum. De maneira geral, a pulorose e tifo aviários quando em infecções agudas, causam queda brusca no consumo de ração, diarreia, desidratação, queda na produção de ovos, redução da fertilidade e da eclosão (SAIF et al., 2008).
Um estudo de FREITAS NETO et al. (2007) realizou uma avaliação clínica em aves de diferentes pesos corporais infectadas com tifo aviário. Os autores observaram que poedeiras leves apresentaram sinais clínicos característicos de tifo aviário antes de virem a óbito, como depressão, prostração, asas caídas, penas eriçadas, falta de apetite e cloaca suja. No mesmo estudo, os autores observaram que aves semipesadas vieram a óbito sem a presença de quaisquer sintomas clínicos.
Para diagnóstico, além dos sinais clínicos, a infecção por Salmonella spp. acarreta lesões macroscópicas em diferentes órgãos. De acordo com FREITAS NETO et al. (2007), as lesões ocasionadas por salmonelas aparecem no fígado e no baço. Esses órgãos apresentam tamanho aumentado com manchas brancas. Além disso, o fígado pode apresentar uma coloração verde-amarelada. Adicionalmente, como sinal clínico, as aves podem apresentar diarreia de coloração esverdeada (DE OLIVEIRA et al., 2005).
As salmonelas podem ser encontradas no ambiente produtivo, desde a cama de aviário, instalações, até as matérias-primas utilizadas para a produção de ração. Um dos principais vetores biológicos de diversos sorotipos de Salmonella nas granjas comerciais é o Cascudinho (Alphitobius diaperinus), uma espécie de besouro que se alimenta de fezes, carcaças, fungos e grãos armazenados.
Esses insetos são os maiores vetores de salmonelas nos ambientes produtivos devido ao seu variado hábito alimentar. De acordo com alguns dados da agroindústria, o cascudinho seria responsável por cerca de 60% dos quadros de salmonelose detectados na produção de frangos de corte (OURO FINO, 2017).
Nesse sentido, o controle do inseto em ambientes de produção pode favorecer a redução da incidência de salmonelas.
Uma questão de saúde pública
Um estudo conduzido pela EFSA avaliou aproximamente 5.000 granjas de poedeiras nas últimas 9 semanas do ciclo produtivo. Foram amostradas excretas das aves e a poeira do ambiente. Como resultados, o estudo encontrou que cerca de 20% das granjas de poedeiras estavam positivas para Salmonella enterica sorovar Enteritidis ou Salmonella enterica sorovar Typhimurium, variando entre 0 a 62,5% de aves positivas entre os lotes.
Nesse mesmo estudo, foram encontrados outros sorovares de Salmonella spp., sendo os mais comuns Salmonella enterica sorovar Enteritidis, Salmonella enterica sorovar Infantus, Salmonella enterica sorovar Typhimurium, Salmonella enterica sorovar Mbandaka e Salmonella enterica sorovar Livingstone (EFSA, 2006). Nesse estudo de campo foi possível observar que, além da prevalência de salmonelas em diferentes granjas, nas mesmas é possível observar uma gama sorotipos de Salmonella responsáveis por infectar humanos, e em porcentagens bastante significativas dentro dos lotes.
“A Salmonella é responsável por aproximdamente um milhão de doenças transmitidas por alimentos por ano nos Estados Unidos e 91.000 na Europa” (PHILEO,2022).
A primeira evidência do envolvimento de Salmonella enteritidis infectando humanos ocorreu em um grande surto nos Estados Unidos em 1986, a partir do consumo de alimentos preparados com ovos. O sorotipo Salmonella Enteritidis foi o principal patógeno responsável por infecções alimentares na Europa e nas Américas durante a década de 80 (VELGE et al., 2005).
Esse sorotipo é o principal envolvido em salmoneloses no continente Europeu, relacionado a aproximadamente 60% dos casos em humanos (THORNS, 2000). Nesse sentido, desde as primeiras notificações, uma parcela signicativa das gastroenterites humanas têm sido relacionadas ao sorotipo S. Enteritidis.
O sorotipo S. Enteritidis pode ser encontrado em carcaças de frangos. Contudo, os ovos e seus derivados ainda são a principal fonte de contaminação – sendo responsáveis por surtos em humanos (SILVA E DUARTE, 2002).
Alguns autores estimaram que os custos com salmoneloses nos Estados Unidos foram em torno de 2,8 bilhões de dólares por ano, aproximadamente $2,47 por acaso de infecção (ADHIKARI et al., 2004).
No Brasil, custos com internações relacionadas a Salmonella spp. transmitidas por alimentos giram em torno de R$ 280 milhões de reais, com uma média de R$ 48 milhões por ano (SALLES, 2007). Contudo, as subnotificações e o desconhecimento do agente infeccioso responsável por internações e desordens de origem gastrointestinal na população eram um desafio há décadas (CARMO et al., 2005) e seguem sendo nos anos atuais.
Referências
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